Dia Internacional das Mulheres

Hoje é 8 de março, Dia Internacional das Mulheres, uma data para enaltecer as mulheres extraordinárias que nos inspiram todos os dias.

Mas para mim também hoje é uma data de pesar, por ainda esta data existir, porque isso nos mostra que ainda as mulheres não atingiram seu objetivo de igualdade.

Eu só otimista e tento ver pelo lado do copo cheio mas tem anos e situações que me deixam triste e o momento atual com pandemia, guerra e intolerância só faz com que eu sinta que o objetivo está mais distante ainda.

Eu trabalho com dor crônica em meu dia dia. Faz parte da minha rotina ouvir pessoas e suas histórias e há coisas que me assustam muito: violência e assédio, sobretudo quando presente dentro do próprio lar.

Hoje por coincidência estava procurando artigos sobre uso abusivo de medicamentos e encontrei este paper:

Chandan JS, Keerthy D, Gokhale KM, Bradbury-Jones C, Raza K, Bandyopadhyay S, Taylor J, Nirantharakumar K. The association between exposure to domestic abuse in women and the development of syndromes indicating central nervous system sensitization: A retrospective cohort study using UK primary care records. Eur J Pain. 2021 Jul;25(6):1283-1291. doi: 10.1002/ejp.1750. Epub 2021 Mar 15. PMID: 33559289.

Nele os autores escreveram sobre o abuso doméstico que é um problema de saúde pública global, com uma relação pouco compreendida com o desenvolvimento de síndromes dolorosas complexas.

Eles usaram um grande banco de dados de cuidados primários do Reino Unido, e fizeram o primeiro estudo de coorte global para explorar isso ainda mais. Compararam 22604 mulheres adultas que foram expostas a violência doméstica (não necessariamente física) e compararam com 44671 mulheres que não passaram por isso. Acompanharam então essas pessoas de forma prospectiva para verificar aquelas que acabavam apresentando problemas que cursam com dor nociplástica, com sensibilização central, com dor crônica. Durante o período do estudo, as mulheres expostas ao abuso doméstico experimentaram um risco aumentado de 2.28 vezes de desenvolver dor lombar crônica, 3 vezes dores de cabeça crônicas, 1.5 vez síndrome do intestino irritável e 1.9 vez síndrome das pernas inquietas.

Encontraram então uma forte carga de morbidade da dor associada ao abuso doméstico, sugerindo a necessidade de intervenção urgente de saúde pública para evitar não apenas o abuso doméstico, mas também as consequências negativas associadas à dor.

Muitas vezes não sabemos disso. Muitas vezes fechamos os olhos para isso. Aí a paciente, ora, é refratária ao tratamento… Será?

Ainda, outros estudos e reportagens mostram que a pandemia por COVID-19 só agravou ainda mais este quadro. Retrocedemos.

Este estudo demonstrou a necessidade de considerar uma história pregressa de violência doméstica em pacientes com dor crônica; e também considerar abordagens preventivas para mitigar o risco de desenvolver dor crônica após a exposição ao abuso doméstico e mais ainda, trabalhar para que a violência doméstica reduza. Isso precisa de educação e diálogo, sem demagogia, com mais ação.

Feliz dia das mulheres. E vamos em frente.