Reportagem sobre o uso da toxina botulínica na DTM

O negócio é o seguinte: quando não se tem assunto, a gente copia e cola dos amigos! rs…

Com autorização, claro, o Prof. Reynaldo Martins Jr. deixou que eu publicasse aqui o que ele escreveu no fórum do site DTM e Dor Orofacial.

Eu estou reunindo informações para escrever aqui também sobre o uso da toxina botulínica tanto na DTM, quanto no bruxismo.

Por enquanto, convido vocês a lerem a reportagem publicada no site Odonto 1 e discutir no fórum sobre este assunto (os comentários poderão ser realizados no fórum e não estarão disponíveis nesta postagem).

O fórum pode ser acessado pelo site www.dtmedor.com.br (necessário um cadastro, rápido e gratuito). Participem!!!

Segue abaixo o texto do Prof. Reynaldo:

Sobre Botox, marolas e tsunamis.

Desde a época da faculdade acompanho “novidades” na área de odontologia, que vem como ondas, abrangendo, (uns mais, outros menos, daí o uso de “marolinhas e tsunamis”), uma parte dos colegas. Como toda onda, maior ou menor, todas passam, ficando os procedimentos restritos a pequenos grupos.

Assim, lembro dos sistemas de avaliação computadorizada da oclusão: era colocado algo entre os dentes (sensor pizoelétrico?) , o paciente mordia e o software mostrava os pontos de contato que deveriam ser removidos. De outra feita, professores recomendavam o uso de articuladores totalmente ajustáveis para se programar o “tratamento” de DTM.  Hoje, dependendo da “escola” do profissional, a bola da vez pode ser  botox,  eletromiografia ou qualquer outro procedimento “revolucionário”.

Em relação à toxina botulínica, fui convidado a uma entrevista para o site “odonto1” falando sobre o tema. O artigo final publicado foi uma síntese do meu e de outros colegas, salvo engano, nenhum deles especialista na área de DTM e Dor. O artigo me pareceu neutro, contemplando todas as posições e leva a concluir que se trata de algo “polêmico”, “controverso”, sem tomar partido.

Abaixo coloco as perguntas e minhas respostas na íntegra. Clicando aqui você é levado à reportagem publicada.

Volto ao assunto em breve.

– Como é feito o tratamento para DTM com o uso da toxina botulínica? como é aplicada e quais são seus efeitos?


Inicialmente, quero reforçar o fato que o termo “Disfunção Temporomandibular” é um termo coletivo que engloba problemas de características clínicas, fisiopatologia e história natural diferentes. Algumas publicações, clínicos e formadores de opinião têm proposto a  utilização da toxina botulínica para tratamento de DTM dos subtipos muscular (Dor Miofascial) e desordens do disco. Aparentemente não se propõe sua utilização para o terceiro subgrupo das DTMs, que engloba artrite, artrose e artralgia da ATM.

Inicialmente, a utilização de toxina botulínica na região orofacial, além dos objetivos cosméticos, parece ter sido proposta principalmente para determinadas desordens do movimento associadas aos músculos da mastigação, como por exemplo discinesias, distonias e deslocamentos mandibulares recorrentes causadas por distúrbios neurológicos ou como consequência do uso de determinados fármacos.

Para DTM, a técnica consiste em infiltrações da toxina botulínica em vários pontos de vários músculos da mastigação. Os autores divergem tanto na localização das infiltrações (com recomendações variando entre os locais de maior atividade muscular conforme análise eletromiográfica; locais de maior volume muscular verificado por palpação; pontos fixos em cada determinado músculo; pontos de maior dolorimento ou desconforto; ou, ainda, diretamente nos pontos-gatilho) quanto em relação a doses.

A toxina botulínica age principalmente na junção neuro-muscular,  bloqueando a liberação da acetilcolina, o neurotransmissor que inicia uma série de eventos na fibra muscular levando a sua contração. Este bloqueio tem como conseqüência a inibição da contração muscular. A intenção é pretensamente interferir no mecanismo de uma controversa hipótese de que a dor miofascial seria causada por um ciclo vicioso de hiperatividade muscular levando a dor, e esta levando a mais hiperatividade muscular. O relaxamento muscular advindo da sua aplicação seria responsável por eventuais efeitos benéficos em casos de DTM de origem muscular, por exemplo.

– O senhor utiliza a toxina em seus tratamentos? se a resposta for não, por que?


Eu não a utilizo, por diversas razões:

 A primeira é falta de evidências da sua eficácia. É importante pontuar que a simples melhora do quadro clínico de um paciente (ou grupo de pacientes), ao contrário do que conclui o senso comum, NÃO comprova a eficácia de qualquer tipo de tratamento de DTM. É bem documentado que DTM é particularmente susceptível a flutuações de sintomas, efeito placebo e remissão espontânea, por isso, a comprovação de eficácia de qualquer terapia a ela direcionada deve ser avaliada em ensaios clínicos randomizados controlados duplo-cegos, com critérios de diagnóstico validados e número adequado de pacientes.

 As publicações sobre a utilização de toxina botulínica em DTM resumem-se, em sua maioria, a descrições da técnica, relatos de caso e série de casos, o que, convenhamos, é muito pouco. Alguns estudos têm encontrado resultados semelhantes quando comparada a infiltração de anestésicos com toxina  botulínica, ou mesmo agulhamento seco de pontos-gatilho de dor miofascial, tanto em músculos da mastigação quanto em outros músculos do corpo.

A segunda é a ausência de evidências da sua superioridade em relação a outras abordagens terapêuticas para DTM. Não é suficiente a comprovação de eficácia de determinada técnica ou terapia, há a necessidade de sua comparação com outras técnicas ou terapias disponíveis.

É sabido que a maioria dos pacientes de DTM (entre 75 e 90%) respondem bem a abordagens não invasivas e de baixo custo, como a associação de incentivos a mudanças comportamentais, exercícios terapêuticos e termo/crioterapia. Assim, é possível afirmar que entre 75 e 90% dos pacientes absolutamente não precisa de toxina botulínica para o controle do seu quadro clínico.

Tal fato nos leva a duas considerações: uma de caráter ético-profissional, já que o nosso código de ética Odontológico é claro ao considerar como infração o não esclarecimento em relação a alternativas do tratamento. Assim, a prescrição de toxina botulínica como abordagem inicial em pacientes de DTM, sem levar em consideração a existência das outras formas de abordagem, ou negando ao paciente o seu conhecimento é injustificável. 

A outra consideração refere-se aos pacientes ditos “refratários”, onde, talvez um dia, tal tratamento possa ter alguma relevância, caso pesquisas futuras adequadamente conduzidas assim o demonstrem.

 Confesso-me cético em relação a isso, já que existem pistas que apontam para outros caminhos em relação a estes pacientes, como a não adesão a terapias conservadoras, fatores genéticos determinantes do sistema de controle e modulação da dor , perfil emocional, de enfrentamento, dentre outros, que não seriam, em tese, alterados pela utilização de toxina botulínica. Tais pacientes provavelmente seriam mais beneficiados por equipe multiprofissional, que pode envolver desde Cirurgiões Dentistas, Médicos Clínicos de Dor, do sono, Psiquiatras e Fisioterapeutas, até Psicólogos e Profissionais de Educação Física, dependendo das freqüentes comorbidades que se apresentem em conjunto com a DTM.

– Quais as desvantagens do uso da toxina botulínica?


No meu entendimento, as principais desvantagens são o custo relativo (em comparação com outras modalidades de tratamento) e a situação de dependência do paciente em relação ao profissional e ao fármaco. O ideal é que os portadores de DTM se tornem sujeitos ativos do seu tratamento, sendo capazes de mudar hábitos e controlarem por si os fatores que influenciam tanto no estabelecimento quanto na manutenção da sua condição. Tal não ocorre quando o tratamento é centrado na aplicação profissional do fármaco. Outra desvantagem é a ausência de protocolo baseado em evidências para sua utilização. Questões sobre como, quando, onde, e sob quais condições utilizá-la parecem estar baseadas antes na preferência e experiência pessoal de cada clínico do que em dados científicos. 

Existe ainda a possibilidade de difusão da toxina em músculos adjacentes causar efeitos cosméticos indesejáveis, como um sorriso assimétrico. Esta situação é evitável através de uma técnica cuidadosa, e é reversível com a fim da duração dos efeitos do fármaco, mas o risco existe, e pode causar inclusive problemas legais: alguém se arrisca a adivinhar em quanto um Juiz avaliaria monetariamente o “sorriso torto” da paciente no casamento da filha única, especialmente quando é negada a informação em relação a alternativas de tratamento?

E , finalmente, apesar da relativa segurança do fármaco, além da possibilidade de sobretratamento, há um risco real que pode trazer sérias conseqüências: a sua utilização por profissionais eventualmente capacitados para tal, mas alheios à realidade da área de Disfunções Temporomandibulares e Dor Orofacial. Deve-se ter em mente que dor na região orofacial pode ser causada por diversas condições que incluem não só DTM, mas também cefaléias primárias e secundárias, as quais podem ter tumores, por exemplo, como causa subjacente. A literatura descreve diversos casos em que pacientes foram a óbito ou sofreram tratamentos mutiladores como consequência de atraso ao tratamento adequado enquanto se tentavam terapias voltadas à DTM, por equívocos grosseiros de diagnóstico. Assim, mais importante do que entender os fundamentos de eventuais tratamentos, é fundamental conhecer a condição que se pretende tratar

– Nos tratamentos em que ela é utilizada, é uma solução definitiva ou é preciso repetir periodicamente a aplicação?

Infelizmente, não existem dados a longo prazo. Os trabalhos que avaliam a técnica normalmente finalizam com uma avaliação dos resultados algum tempo (por exemplo, entre 28 dias e 8 semanas) após a infiltração do fármaco. Alguns relatos de casos descrevem aplicações adicionais em intervalos de 3 a 4 meses, outros de acordo com a evolução de cada caso. Como descrito acima, infelizmente não há um consenso no protocolo da sua utilização.

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