Manobra para (des)travamento – parte 2

Já falei sobre as manobras utilizadas quando ocorre um deslocamento do disco sem redução agudo em ATM aqui. Chegou a vez de falar sobre a famosa manobra para luxação da ATM.

Mas vamos primeiro definir o problema. Mais uma vez utilizado o Guia da Academia Americana de Dor Orofacial:

Deslocamento da ATM

Critérios de diagnóstico – todos os critérios a seguir devem estar presentes:

  1. Incapacidade para fechar a boca sem uma manobra de manipulação específica.
  2. Evidências radiográficas revelam que a cabeça da mandíbuila está bem à frente do tubérculo articular

O seguinte aspecto pode acompanhar os itens acima:

  • Dor no momento do deslocamento com leve dor residual após o episódio.

Diagnóstico diferencial: fratura.

Bem, uma coisa é certa, não sei se este critério de diagnóstico é seguido no consultório. Imagine você que em sua frente está um paciente desesperado que não consegue fechar a boca e então você diz: “Ok, vá ao centro de radiologia fazer uma radiografia de sua ATM antes de eu tentar manobrá-la para ter certeza do diagnóstico”.  Claro que esta condição deve ser distinta de uma fratura, mas aí haverá o fator trauma para auxiliar no diagnóstico.

Embora que tenham pessoas que riem desta situação…

Enfim, vamos ao que interessa!

Ao contrário das manobras que falei na parte 1, a manobra para deslocamento agudo da ATM é bem conhecida. Normalmente a redução pode ser realizada sem uso de anestésico pela manipulação da mandíbula. Mas em casos de dor ou tensão muscular mais evidente (o que ocorre após algumas horas), pode-se considerar o bloqueio anestésico da ATM. É importante orientar o paciente para que ele não tente fechar a boca. Quanto mais o paciente força o fechamento, mais contração é realizada pelo músculo pterigoideo lateral, mais difícil a manipulação. Alguns profissionais sugerem o uso de um benzodiazepínico para relaxamento da musculatura e facilitar a manobra. Em alguns casos até mesmo anestesia geral pode ser utilizada. No vídeo que coloquei logo abaixo, o paciente está em um hospital americano e o anestesista usa o propofol (sim, o mesmo que matou Michael Jackson, mas desta vez na dosagem certa… 🙂 ) para promover o relaxamento e trazer conforto ao paciente.

A manobra é realizada com as duas mãos. Não se pode esquecer da proteção dos dedos do operador. Muitas vezes, a ATM retorna de forma rápida e brusca, promovendo um fechamento de boca tão rápido quanto, o que pode gerar uma bela mordida nos dedos. Há um certo tempo atrás vi que um protetor para dedos de silicone (para serem utilizados nesta condição) havia sido patenteado por uma empresa americana. Fiz uma busca rápida no google, mas não encontrei. Alguém já viu?

Encontrei várias descrições desta manobra (quase sempre a mesma). Assim, para ter uma referência, vou colocar como está descrito no livro do Prof. Okeson:

Quando está se tentando reduzir o deslocamento, o paciente deve tentar abrir mais como se estivesse bocejando. Isso ativa os músculos depressores mandibulares e inibe os elevadores. Ao mesmo tempo, aplica-se pressão no mentopara se tentar reduzir o deslocamento espontâneo.

Se isso não obtiver sucesso, o clínico deve envolver bem seus polegares com uma gaze e posicioná-los nos molares mandibulares exercendo pressão para baixo enquanto o paciente boceja.

Ao mesmo tempo em que se exerce pressão para baixo, pode-se com os demais dedos, elevar o queixo do paciente, o que força a mandíbula para trás. É interessante observar que, como lembra o Prof. Okeson,  da mesma forma que a anestesia da ATM pode ser realizada, também pode-se infiltrar o músculo pterigoideo lateral, uma vez que este pode estar em espasmo e impedir a manobra.

Uma bandagem para contenção provisória da mandíbula pode ser realizada.

Os pacientes que deslocam frequentemente a mandíbula muitas vezes aprendem a realizar alguma manobra e reduzir o travamento aberto.

O que escrevi é relacionado a casos agudos. Mas talvez a maneira mais eficiente de tratar esta condição, quando crônica e frequente, é a própria prevenção, com o ensino dos limites aos pacientes, de exercícios e de técnica de redução. Bem, mas isso é tema para um próximo episódio!!

Segue um vídeo onde se realizada a manobra.

 

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3 pensamentos sobre “Manobra para (des)travamento – parte 2

  1. Cara drª Julia. Primeiro parabéns pelo blog. Muito bom!
    Escrevo para te dar uma sugestão quanto a manobra para redução de travamento em boca aberta.
    1º se colocarmos o paciente deitado, e nos posicionarmos atrás, podemos introduzir nossos polegares na eminência anterior do ramo/trigomo retromolar, e com os restantes dedos apoiá-los na pele sobre o corpo e angulo mandibular. Com uma suave pressão nos polegares, para trás e para baixo, guiando o movimento com os restantes dedos para provocar uma “rotação/translação” natural da própria mandíbula.
    2º O decúbito dorsal, permite ao paciente relaxar realmente a cintura escapular, o pescoço e os demais músculos da face; dá-nos um apoio firme para esta manobra, sem obrigar o paciente a suportar todo o peso das nossas mãos;
    3º Não se preocupe com os dedos, após distensão excessiva, nenhum músculo consegue contrair abruptamente e muito menos com força. De qualquer forma os dedos estão atrás dos dentes.
    4º Se durante a manobra, fizeres deslizamento dos dedos sobre o masseter (massagem!) acompanhada de comandos de relaxamento (“solto..relaxa….”) em poucos segundos e de uma forma sutíl terás teu resultado.
    Um cordial abraço, Ivan.

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