Mindfulness

Eu sempre acompanho os movimentos de terapias para melhorar a qualidade de vida dos pacientes com dor crônica.

No último Congresso Mundial de Dor, promovido pela IASP, vi vários pôsteres que falavam sobre meditação e o quão benéfico é para nossos pacientes.

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Desde então estava com vontade de convidar a fisioterapeuta Michele Peres Ferreira que desenvolve um trabalho muito bacana nesta área no Brasil para escrever aqui sobre o assunto (nada melhor do que uma pessoa com expertise não é?).

Finalmente consegui!! Obrigada Michele por sua disponibilidade!

Mindfulness, viva com atenção plena!

por Michele Peres Ferreira

FOTO Profissional

 

Você já ouviu falar em Mindfulness? 

 

Vamos falar sobre esse tema que está em alta?

 

Segundo Jon Kabat-Zinn, Mindfulness é um estado mental de estar atento à experiência no momento presente, sem julgamento. 

Quando traduzirmos a palavra Mindfulness para o português o resultado é Atenção Plena. Isso significa que um dos principais componentes desse estado mental é a atenção. 

Diferentemente do que muitos acreditam, meditar não significa contorcer o corpo ou esvaziar a mente. A meditação da atenção plena é como um esporte, se trata de um treinamento de concentração da mente. O Mindfulness é um exercício laico, derivado do Budismo, mas não exige qualquer fé religiosa nem é necessário se tornar budista. 

Meditar pode ser difícil, especialmente no início. É como ir à academia. Se você não estiver ofegante nem suando, é provável de que não esteja fazendo direito. Da mesma forma, se começar a meditar e logo se encontrar num êxtase livre de pensamentos, ou você se iluminou de repente ou está morto. A prática fica mais fácil com o tempo, mas mesmo após anos de meditação, você irá se distrair muitas vezes. 

A meditação nos faz entrar em contato com uma realidade pouco explorada, a nossa voz interna, isso significa que nossa mente está o tempo todo discutindo com ela mesma sobre os fatos do passado ou do futuro, fazendo listas, ensaiando discussões, remoendo coisas etc. É como Mark Twain diz: “Algumas das piores coisas da minha vida nunca chegaram acontecer”. Isso significa que pensamos muito o tempo todo, e sentimos a carga emocional dos nossos pensamentos, e na maioria das vezes sofremos mais por eles, do que pela própria realidade. Quando não temos consciência desse falatório interior incessante, ele pode nos controlar e nos enganar. 

O nosso estado mental nada mais é do que a forma como reagimos e nos comportamos nas diversas situações apresentadas em nossa vida. O interessante é que 70% do nosso estado mental pode ser treinado, sendo apenas 30% dele genético. Isso significa que podemos exercitar e treinar o nosso cérebro a estar mindful, ou seja, estar atento e consciente para o momento presente. O processo de treinamento do nosso cérebro ocorre através da meditação que explora o controle atencional, o autoconhecimento e a auto-regulação emocional.

Quantas vezes você realizou uma tarefa de forma tão automática que nem se deu conta de qual foi o processo para concluí-la? Um exemplo muito comum disso são pessoas que estão acostumadas a fazer sempre o mesmo caminho para voltarem para casa, e que ao chegarem percebem que nem se deram conta do caminho percorrido. Isso significa que você está inconsciente da tarefa que está realizando naquele momento, ou seja, sua mente não está no momento presente, a sua atenção está voltada para os pensamentos: “Preciso comprar leite… Ainda não paguei a conta de luz… Se eu não terminar o relatório até amanhã meu chefe me mata!”; e assim você chega na sua casa sem saber exatamente como.

Nossos pensamentos, em sua grande maioria, costumam ser negativos ou irreais, frutos da nossa imaginação, de coisas que já aconteceram, vão acontecer ou talvez nem aconteçam. Enquanto focamos a atenção para esses pensamentos gastamos energia e tempo com coisas improdutivas. É comum vivermos no passado ou no futuro, esquecendo do momento presente, ocasionando um aumento dos níveis de ansiedade e estresse.

Hoje estamos vivendo em uma era da multitarefa, temos dificuldade de ficar ociosos, qualquer folguinha, nem que seja um minuto, recorremos ao celular, para checar os e-mails, dar uma espiada nas redes sociais e com isso nossa mente entra em um processo de exaustão. Pessoas estão dormindo e acordando cansadas, o cérebro deixa de recuperar a energia pois está sempre em atividade.

O cérebro é um órgão plástico, flexível e treinável, o que torna possível exercitá-lo para modificar o estado mental e aumentar o nível de concentração. (Veja no link:A. Brefczynski-Lewis*, A. Lutz*, H. S. Schaefer, D. B. Levinson*, and R. J. Davidson* Neural correlates of attentional expertise in long-term meditation practitioners. Proc Natl Acad Sci U S A. 2007 Jul 3;104(27):11483-8. Epub 2007 Jun 27.)

O treinamento e aprendizado geralmente se dá através de técnicas de autorregulação da atenção com prática da meditação e de outros exercícios afins, permitindo uma maior tomada de consciência de seus processos mentais e de suas ações. As práticas e exercícios de meditação ajudam a alcançarmos essa alteração a nível central. 

Ao contrário do que muitos pensam não é porque você começou a meditar que irá virar uma pessoa super calma e sem problemas, mas então qual seria o benefício de se tornar uma pessoa consciente, atenta, mindful? Através do treinamento de mindfulness temos como objetivo perceber pensamentos, sensações corporais e emoções no momento que ocorrem, sem reagir de maneira automática e habitual. Com isso, aprendemos a fazer escolhas mais conscientes e funcionais, influenciando positivamente na maneira como lidamos com os desafios cotidianos e em relações interpessoais. Através de Mindfulness, aprendemos a regular as emoções desafiadoras e reduzir aquele discurso interno mental que aparece nas circunstâncias difíceis.

Profissionais da área da saúde estão estudando cada vez mais o Mindfulness e seus benefícios para redução do estresse, ansiedade, aumento da concentração e manejo da dor. 

 

Vamos falar sobre a utilidade dessa ferramenta na dor ?

 

Bom, a dor crônica é freqüentemente definida como uma dor que dura mais que 3 meses ou após o tempo normal de cicatrização tecidual e que pode levar a consequências médicas, sociais e econômicas significativas, problemas de relacionamento, perda de produtividade e altos custos com cuidados de saúde. 

A alta prevalência e natureza refratária da dor crônica, em conjunção com as consequências negativas da medicação, levou ao aumento do interesse em planos de tratamentos que incluem terapia adjuvante ou alternativas à medicação. 

Uma dessas modalidades que os pacientes com dor estão usando é essa meditação que comentamos Mindfulness. Esse treinamento trabalha reorientando a mente para o presente momento e aumentando a consciência do ambiente externo e das sensações internas, permitindo o indivíduo a reformular as experiências. 

Ao incluir o Mindfulness nos tratamentos os pacientes são encorajados a mudar a maneira como eles se relacionam com a dor, suspendendo o julgamento de  pensamentos que acompanham a percepção da dor. Isso desacopla teoricamente a dimensão sensorial da dor da reação de alarme afetivo resultando em uma atenuação da experiência de sofrimento através da reavaliação cognitiva. ( Yi‑Yuan Tang*, Britta K. Hölzel* and Michael I. Posner. The neuroscience of mindfulness meditation. NATURE REVIEWS | NEUROSCIENCE. 16 (2015)  213-225.)

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Os programas de Mindfulness foram empregados por quase 40 anos para o tratamento de várias condições de dor crônica, incluindo lombalgia, enxaqueca, dores de cabeça e dor musculoesquelética. Muitas vezes, não é possível eliminar a dor, mas o paciente aprende habilidades para viver uma vida produtiva na presença de desconforto ou incapacidade. 

Estudos recentes utilizaram neuroimagem para elucidar mecanismos neurofisiológicos e os efeitos subjacentes da atenção plena no cérebro. Uma recente revisão sistemática observou que a regulação da dor pelas técnicas de meditação podem alterar o funcionamento das regiões do cérebro em uma extensa rede, incluindo regiões não nociceptivas. Mas principalmente reduziu a experiência afetiva da dor, enquanto as reduções de intensidade da dor foram menos consistentes. Alterações cerebrais foram demonstradas como resultado da aplicação de medidas psicológicas e pode representar as implicações clínicas de alterações na atividade cerebral ou morfologia.

Em estudos de mindfulness em pacientes com dor tem se mostrado promissores, em relação a sintomas de desconforto relacionado a dor, perturbação do humor, ansiedade, e depressão, bem como a utilização de drogas relacionadas ao controle da dor. Apesar dos resultados positivos, recentes revisões sistemáticas sugerem a realização de estudos de alta qualidade para a recomendação do uso da meditação mindfulness para sintomas de dor crônica. 

Portanto, parece que estamos no caminho certo, mas ainda há necessidade de muitos estudos qualificados para se “bater o martelo”, e dessa forma vamos modificando nossas abordagens terapêuticas para uma abordagem mais humanizada, valorizando o ser em todos os seus aspectos e não somente os biológicos. 

Referências:

Kabat-Zinn J, Lipworth L, Burney R. The clinical use of mindfulness meditation for the self-regulation of chronic pain. J Behav Med. 1985 Jun;8(2):163-90.

Sun TF1, Kuo CC, Chiu NM. Mindfulness meditation in the control of severe headache. Chang Gung Med J. 2002 Aug;25(8):538-41.

Cherkin DC, Anderson ML, Sherman KJ, Balderson BH, Cook AJ, Hansen KE, Turner JA. Two-Year Follow-up of a Randomized Clinical Trial of Mindfulness-Based Stress Reduction vs Cognitive Behavioral Therapy or Usual Care for Chronic Low Back Pain. JAMA. 2017 Feb 14;317(6):642-644. doi: 10.1001/jama.2016.17814.

Ref: Hilton L, Hempel S, Ewing BA, Apaydin E, Xenakis L, Newberry S, Colaiaco B, Maher AR, Shanman RM, Sorbero ME, Maglione MA.Mindfulness Meditation for Chronic Pain: Systematic Review and Meta-analysis. Ann Behav Med. 2017 Apr;51(2):199-213. doi: 10.1007/s12160-016-9844-2.

Ref: Simone S. Nascimento, Larissa R. Oliveira, Josimari M. DeSantana, Correlations between brain changes and pain management after cognitive and meditative therapies: A systematic review of neuroimaging studies. Complementary Therapies in Medicine 39 (2018) 137–145.

A Michele também enviou para nós um vídeo super bacana sobre aceitação e dor. Vale a pena assistir!

Obrigada Michele!!!

Para quem quiser ler a dissertação de mestrado da Michele sobre avaliação funcional da coluna cervical em pacientes com DTM, clique aqui.

E se tiver dúvidas, comentários, etc, clique aqui para enviar um email a Michele! 🙂

 

 

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Laserterapia em DTM

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Dias desses fiz uma revisão dos novos artigos que saíram sobre laserterapia para tratamento da Disfunção Temporomandibular (sempre uso o site Pubmed.com para isso #ficaadica). Encontrei publicado agora em janeiro um artigo novo sobre o assunto. Nele os pesquisadores procuraram avaliar o laser de baixa intensidade no relato de dor do paciente, no limiar de dor à pressão e também em índices de qualidade de vida relacionado a saúde. O bacana deste estudo foi seu desenho: randomizado, placebo-controlado. Fiquei bem feliz em ver que o estudo havia sido realizado pela equipe da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da USP, e tem como autora principal a colega Lais Magri. Aqui o link para o resumo!

Eu como não sou boba e sabendo que a Lais é leitora do blog, pedi a ela um texto sobre o assunto! E hoje chegou aqui na caixa de emails! \o/

Com vocês, o texto!

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Laís Valencise Magri Mestre em Gestão da Clínica – UFSCar Doutoranda em Psicobiologia – FFLCRP Cirurgiã-dentista da área de Oclusão, Disfunção Temporomandibular e Dor Orofacial da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (FORP/USP) CROSP: 101.093

Laserterapia de baixa intensidade na DTM dolorosa: separando o joio do trigo

 

“Não é possível…deve haver alguma coisa errada com estas tais pesquisas científicas…trato todos os meus pacientes de DTM com laser e a grande maioria melhora!”

Pois é…antes da Medicina/Odontologia baseada em Evidências todo o conhecimento científico advinha das experiências clínicas e opiniões de especialistas, todavia nem sempre é possível garantir que aquela terapia que você está empregando vai trazer benefícios para todos os pacientes. E esta é a base da ciência…investigar se esse tratamento pode ser extrapolado para populações maiores, com eficácia superior ao placebo e custo-benefício que valha o tempo e o dinheiro investidos.

Diversas pesquisas científicas já foram publicadas buscando compreender a efetividade da laserterapia de baixa intensidade (low-level laser therapy – LLLT) no tratamento da DTM dolorosa, sendo que os ensaios clínicos mais bem conduzidos nas metanálises demonstram resultados clínicos de remissão da dor similares ao grupo placebo (Petrucci et al., 2011; Moraes Maia et al., 2012; Herranz-Aparicio et al., 2013; Chen et al., 2015; Herpich et al., 2015). Porém, mais estudos ainda precisam ser desenvolvidos para a confirmação dos resultados e avaliação de outras doses e protocolos de LLLT.

            Os efeitos “biológicos” promovidos pelo laser nas células e tecidos já foram demonstrados em pesquisas com modelos animais e culturas celulares. Dentre estes efeitos, os mais citados são: ação anti-inflamatória (redução de substâncias pró-inflamatórias), analgésica (redução de alodinia e hiperalgesia orofacial), atuação no metabolismo oxidativo muscular e na expressão de metaloproteinases, além da modificação a permeabilidade da membrana celular (Rizzi et al, 2010; Dias et al., 2011; Pires et al, 2011; Desiderá et al., 2015).

            Certo…mas então as pesquisas em modelos animais demonstram resultados “biológicos” efetivos promovidos pela LLLT, então por que alguns ensaios clínicos com seres humanos apontam que o laser é semelhante ao placebo?

            Pois é, ser humano é bastante complicado…especialmente quando falamos sobre dor crônica, que envolve aspectos cognitivos, comportamentais e motivacionais. Ora, se o estímulo nociceptivo não está sendo enviado pela periferia, mas sim relacionado à outros fenômenos muito mais complexos: sensibilização central e “pain widesprading” (espalhamento da dor), a utilização de um terapia isolada que promova efeitos “biológicos” locais pode não resolver completamente o problema. Parece um raciocínio simples, não é mesmo? Mas e o efeito placebo?

            A melhor evidência sobre o tema na atualidade foi publicada na Journal of Oral Rehabilitation em 2015 por Chen et al., se trata de uma metanálise de 14 ensaios clínicos controlados e randomizados (os autores foram bem criteriosos na seleção dos ensaios e excluíram diversos estudos que não tinham grupo placebo ou que não passaram por randomização). Eles concluem que o uso da LLLT no controle da DTM dolorosa tem uma eficácia limitada, sendo que muitos estudos apontam resultados semelhantes ao placebo, embora ela contribua de forma significativa para a melhora dos padrões funcionais (mobilidade mandibular) (Chen et al., 2015). Outros estudos de revisão sistemática e metanálise chegam à mesma conclusão (Petrucci et al., 2011; Herranz-Aparicio et al., 2013; Herpich et al., 2015).

            O grande problema é que não existem doses e protocolos estabelecidos, o que acaba dificultando a comparação entre os estudos. Outro ponto importante a ser considerado é que o placebo do laser tende sempre a ser maior do que o placebo de outras modalidade terapêuticas, pois o laser é um equipamento de alto custo e que envolve tecnologia, além da associação que os pacientes fazem com outros tipos de lasers que são amplamente publicizados no mercado, como depilação à laser e clareamento à laser. Portanto, a expectativa em relação aos resultados clínicos costuma ser grande, aumentando o efeito placebo.

            Embora seja relevante considerar que os aspectos que permeiam o efeito placebo (sentimento de estar sendo cuidado, relação profissional-paciente, memória, experiências prévias, dentre tantos outros) estão intimamente associados às dimensões cognitiva-comportamental-motivacional da dor crônica. Faz-se necessário então, reavaliar o efeito placebo de ensaios clínicos que investiguem terapias para dor crônica sob esta nova perspectiva: quando lemos os artigos científicos que analisam a LLLT na DTM dolorosa e vemos que o placebo foi semelhante ao laser, talvez não signifique que o laser não “funcione” ou não tenha efeito algum, mas sim que os aspectos que permeiam o placebo sejam tão efetivos na percepção subjetiva de melhora da dor, quanto os efeitos “biológicos” promovidos localmente pelo laser. Há que se considerar também que nos pacientes que recebem laserterapia ativa, o efeito placebo também está presente.

            E para complicar mais um pouco…os sinais e sintomas de DTM são flutuantes e auto-limitantes em muitos casos. Ou seja, quando um paciente se dispõe a participar de um ensaio clínico ou busca atendimento no seu consultório, ele está com escores máximos de dor (estar com dor é inclusive um critério de inclusão para as pesquisas e a seleção da amostra é sempre feita com base na variável de interesse sendo anormal). A tendência é que haja regressão à média….Que é um fenômeno estatístico bastante simples de ser compreendido: quando temos medidas repetidas de uma mesma variável, a tendência de uma medida inicial extrema é sempre regredir à média – agora vamos pensar em um paciente com DTM dolorosa: esse paciente geralmente tem uma dor leve entre 2 e 3 na Escala Visual Analógica ou não apresenta epidódios de dor, porém ele está passando por problemas financeiros e agora sua dor está por volta de 8 ou 9, então ele vai te procurar no consultório porque nesse momento a dor dele está incomodando. Todavia, os problemas financeiros são resolvidos e ele retorna ao seu padrão médio progressivamente: sem dor ou com uma dor leve. Nas pesquisas tal fato é comum de ocorrer, pois no início do estudo os escores de dor são sempre mais elevados do que quando comparados estatisticamente ao longo do tempo, e isto pode ser um simples resultado da regressão à média.

            Efeito do laser, efeito placebo ou regressão à média? Agora fiquei confuso…

            “Regression to the mean is a potent source of deception” – Regressão à média é uma potencial fonte de decepção/engano. Li isso em algum lugar e nunca mais saiu da minha cabeça, pois podemos extrapolar este conceito para qualquer outro tipo de terapia. Portanto, para que um tratamento seja considerado de efetividade, ele precisa ser superior ao placebo e à regressão à média, justificando desta maneira a sua utilização.

            A única maneira de desvendar este mistério é por meio de ensaios clínicos randomizados controlados duplo-cegos que contenham os três grupos: laser ativo, placebo e um grupo que não receba qualquer tratamento e que seja acompanhado pelo mesmo período de tempo que os demais grupos.

E cadê esses estudos?

            Poucos são as pesquisas com LLLT que obedecem à todos os critérios de seleção, pareamento e randomização da amostra, além do cegamento e grupo sem tratamento, que são os requisitos de um ensaio clínico de qualidade. Além do fato de que quando um grupo de pesquisadores começa a desenvolver uma pesquisa com LLLT, geralmente a dose e o protocolo de aplicação são escolhidos com base em outros estudos ou em experiências prévias do grupo, pois não há até o presente momento um consenso sobre isso…Ou seja, ainda não está completamente estabelecido qual o melhor comprimento de onda, qual a dose, quantas sessões, qual o intervalo entre as sessões, qual o protocolo para DTM muscular e articular. Cada fabricante de laser traz um protocolo diferente, dificultando a padronização das pesquisas e a comparação dos resultados.

            É preciso que nós, profissionais atuantes na área da dor orofacial, saibamos diferenciar os níveis de evidência científica, em especial no momento em que vamos pesquisar acerca de alguma terapia que pretendemos utilizar em nossos consultórios. Uma boa dica é sempre procurar pelas metanálises e revisões sistemáticas, que são estudos criteriosos que já avaliaram os ensaios clínicos mais confiáveis e nos trazem um panorama geral sobre aquela modalidade terapêutica até o presente momento.

            Em minha pesquisa de doutorado, que está sendo desenvolvida sob orientação da Prof. Christie Ramos Andrade Leite-Panissi no Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia em parceria com a Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (FORP) da USP, estamos desenvolvendo um ensaio clínico randomizado duplo-cego que avalia a efetividade da laserterapia de baixa intensidade nas variáveis de dor (intensidade, sensibilidade e qualidade) e emocionais (ansiedade e estresse-cortisol salivar) de mulheres com DTM dolorosa (dor miofascial), que inclui grupo laser ativo, placebo e sem tratamento. Esperamos com esta pesquisa, compreender as flutuações na percepção da dor e de aspectos emocionais ao longo da LLLT, que possam contribuir com a variabilidade de resultados clínicos obtidos com esta terapia (Magri et al., 2017).

            Enfim, até o momento há muitas dúvidas sobre este tema e as respostas ainda não estão prontas, pois o desenvolvimento do conhecimento científico é um trabalho árduo e longo. Em minha opinião, precisamos ser imparciais e investir em pesquisas de qualidade que possam de fato esclarecer todos estes questionamentos, a fim de que possamos utilizar este recurso terapêutico em nossos consultórios com segurança e clareza acerca de seu efeito na DTM dolorosa, ou então chegar realmente à conclusão de que os resultados clínicos obtidos com a LLLT não apresentam comprovação científica.

            Portanto, não chegamos ao final desta história…a laserterapia de baixa intensidade na DTM dolorosa ainda é um conhecimento em construção, cujo alicerce só pode ser sólido se erguido com base em pesquisas científicas com elevado nível de evidência. E desejo a você leitor…que este texto te motive a questionar suas práticas e leituras…é preciso saber separar o joio do trigo…

Obrigada Laís por ajudar este blog e compartilhar aqui seu texto!

Colocarei as referências utilizadas aqui abaixo. Quem tiver interesse em ler o trabalho da Lais, envie um email para juliana.dentista@gmail.com ou entre para nosso grupo no Facebook (peça solicitação via mensagem Facebook).

 

Seguem as referências citadas:

  1. Chen J, Huang Z, Ge M, Gao M. Efficacy of low-level laser therapy in the treatment of TMDs: a meta-analysis of 14 randomised controlled trials. J Oral Rehabil. 2015 Apr;42(4):291-9.
  2. Desiderá AC, Nascimento GC, Gerlach RF, Leite-Panissi CR. Laser therapy reduces gelatinolytic activity in the rat trigeminal ganglion during temporomandibular joint inflamation. Oral Dis. 2015; 21(5): 652-658.
  3. Dias FJ, Issa JPM, Vicentini FTM d eC, Fonseca MJV, Leão JC, Siéssere S, et al. Effects of Low-Level Laser Therapy on the Oxidative Metabolism and Matrix Proteins in the Rat Masseter Muscle. Photomedicine and Laser Surgery. 2011; 29 (10): 677:684.
  4. Herpich CM, Amaral AP, Leal-Junior EC, Tosato Jde P, Gomes CA, Arruda ÉE, Glória IP, Garcia MB, Barbosa BR, Rodrigues MS, Silva KL, El Hage Y, Politti F, Gonzalez Tde O, Bussadori SK, Biasotto-Gonzalez DA. Analysis of laser therapy and assessment methods in the rehabilitation of temporomandibular disorder: a systematic review of the literature. J Phys Ther Sci. 2015 Jan;27(1):295-301.
  5. Herranz-Aparicio J, Vázquez-Delgado E, Arnabat-Domínguez J, España-Tost A, Gay-Escoda C. The use of low level laser therapy in the treatment of temporomandibular joint disorders. Review of the literature. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2013 Jul 1;18(4):603-12.
  6. Magri LV, Carvalho VA, Rodrigues FC, Bataglion C, Leite-Panissi CR. Effectiveness of low-level laser therapy on pain intensity, pressure pain threshold, and SF-MPQ indexes of women with myofascial pain. Lasers Med Sci. 2017 – Jan 4.
  7. Maia ML, Bonjardim LR, Quintans Jde S, Ribeiro MA, Maia LG, Conti PC. Effect of low-level laser therapy on pain levels in patients with temporomandibular disorders: a systematic review. J Appl Oral Sci. 2012 Nov-Dec;20(6):594-602.
  8. Petrucci A, Sgolastra F, Gatto R, Mattei A, Monaco A. Effectiveness of low-level laser therapy in temporomandibular disorders: a systematic review and meta-analysis. J Orofac Pain. 2011 Fall;25(4):298-307.
  9. Pires D, Xavier M, Araújo T, Silva JA Jr, Aimbire F, Albertini R. Low-level laser therapy (LLLT; 780nm) acts differently on mRNA expression of anti- and pro-inflammatory mediators in a experimental model of collagenase-induced tendinites in rat. Lasers Med Sci. 2011; 26:85-89.
  10. Rizzi EC, Issa JPM, Dias FJ, Leão JC, Regalo SCH, Siéssere S, et al., Low-Level Laser Intensity Application in Masseter Muscle for Treatment Purposes. Photomedicine and Laser Surgery. 2010; 28 (2): S31-S35.

 

Aula ministrada sobre Fibromialgia

Em 2013 resolvi montar uma aula sobre Fibromialgia e acrescentar alguns quadros que gosto muito ao contexto! Gostei tanto que 3 anos depois ainda ministro a mesma aula, só atualizando alguns slides.

Fiz uma postagem aqui sobre o assunto e inclusive sobre cada quadro que citei e porque Fibromialgia é tão importante na minha vida. Para ler clique aqui e aqui.

Hoje me lembrei do site Slideshare que permite deixar a aula em slides para visualização. Coloquei a aula para todos vocês!

(Tenho algumas aulas por lá também sobre outros assuntos. Confira no link: http://www.slideshare.net/julianadentista)

E para terminar o assunto, que tal ler alguns artigos recentes sobre fibromialgia e dor difusa? Seguem alguns gratuitos e que tem participação de um dos meus autores favoritos: Prof. Daniel Clauw.

Bom feriado a todos! 🙂

 

Estudo OPPERA sobre Disfunção Temporomandibular

Em maio deste ano escrevi aqui sobre os resultados preliminares do estudo OPPERA sobre disfunção temporomandibular.

Hoje no facebook (curta a página do blog aqui!) vi que o colega José Luiz Peixoto Filho avisou que estes resultados foram publicados em uma série de artigos na revista Journal of Pain com acesso gratuito.

Vale a pena conferir!

Para quem quiser fazer download, este é o link: http://www.jpain.org/issues?issue_key=S1526-5900%2811%29X0013-5

 

 

 

Reunião com CFO sobre ácido hialurônico

Acho que a maioria dos dentistas já estão sabendo da resolução do Conselho Federal de Odontologia com relação ao uso do ácido hialurônico em procedimentos odontológicos:

Resolução do CFO proíbe o uso da toxina botulínica para fins estéticos na Odontologia

O Conselho Federal de Odontologia publica a Resolução CFO 112 / 2011, que dispõe  sobre o uso do ácido hialurônico e da toxina botulínica em procedimentos odontológicos. 

Pela Resolução, fica proibido o uso do ácido hialurônico na Odontologia. A norma também restringe o uso da toxina botulínica por cirurgiões – dentistas, estando proibido o uso dessa substância para fins estéticos e permitido o seu emprego para fins exclusivamente terapêuticos.

Para ter acesso à integra da Resolução CFO 112 / 2011, clique aqui.

Pois bem, pelo enunciado acima, retirado do site do CFO, entende-se que o ácido hialurônico está proibido mas libera a toxina botulínica para fins terapêuticos. Engraçado isso… Quem consulta a literatura sabe que existem muito mais estudos clínicos envolvendo o uso do ácido hialurônico do que a toxina botulínica.

O Prof. Dr. Marcelo Mascarenhas, coordenador do Comitê Brasileiro de Dor Orofacial da Sociedade Brasileira de Estudo da Dor (SBED) relatou que esteve ontem em uma reunião com o presidente do CFO e sua diretoria e mostrou sua indignação com a proibição do uso do ácido hialurônico e defendeu o uso da substância na viscossuplementação da articulação temporomandibular (ATM) o que, segundo ele, era desconhecido pela maioria dos membros ali presentes. Ele entregou ainda uma compilação de  22 artigos publicados na literatura (estudos clínicos e revisões sistemáticas) como colaboração ao CFO e solicitou alteração ou anulação da resolução acima citada.

A quem possa interessar, colocarei abaixo 18 estudos classificados como estudos clínicos randomizados e revisões metanálises sobre o uso do ácido hialurônico na ATM.

Obrigada pela informação Marcelo!!!

Abraços a todos

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