A repercussão ao texto da AADR sobre DTM e o uso de tecnologia nos consultórios…

Misturei dois textos que vi esta semana numa postagem só.

Há algumas postagens atrás disponibilizei aqui no blog o texto de posicionamento da Associação Americana de Pesquisa em Odontologia (AADR) sobre Disfunção Temporomandibular.

Para quem ainda não leu nem o prefácio e nem o texto e até mesmo nunca ouviu falar no assunto, sugiro que clique aqui antes de continuar a ler este post! 🙂

Bem, este texto teve apoio da Academia Americana de Dor Orofacial (AAOP) e da Academia Europeia de Distúrbios Craniomandibulares.

O fato curioso é que este texto foi publicado pela revista da ADA –American Dental Association – o JADA e gerou um número recorde de cartas ao editor, em resposta a publicação. Foram 228 cartas!

Não tínhamos acesso à estas cartas mas estávamos muito curiosos. Eu imaginava que a maioria seria em apoio ao texto, já que é um texto objetivo e direto e condiz com que observamos na literatura e mesmo na, pelo menos minha, prática clínica.

Mas a história não foi bem essa. Hoje recebi por email o link para acesso a estas cartas. É este aqui: http://jada.ada.org/cgi/reprint/141/12/1410-a

Pelo teor das cartas, parece que a maioria foi escrita por um grupo de cirurgiões dentistas americanos que parecem ser especialistas (não sei se existe esta especialização) em odontologia neuromuscular. A bronca maior destes dentistas com o texto vem de encontro aos métodos de diagnóstico.

Veja esta parte do texto:

recomenda-se que o diagnóstico diferencial das DTM ou condições dolorosas orofaciais relacionadas deve basear-se primariamente em informações obtidas a partir da entrevista do paciente (anamnese), exame clínico e, quando indicado, exames radiográficos das ATM ou outros procedimentos imageológicos. A escolha de procedimentos diagnósticos adjuvantes deve ser baseada em dados publicados, revisados independentemente (“peer-reviewed”), que demonstrem sua eficácia diagnóstica e segurança. No entanto, o consenso da literatura científica recente sobre dispositivos eletrônicos atualmente disponíveis para o diagnóstico das DTM é que, exceto para várias modalidades imageológicas, nenhum deles demonstra sensibilidade ou especificidade necessárias para se distinguir indivíduos normais de pacientes de DTM ou para distinguir diferentes subgrupos de DTM…

De certa forma este texto serve para refletirmos sobre a oferta de tecnologia e sobre o que realmente é comprovado pelo literatura como sensível e específico.

Sobre este assunto tecnologia e diagnóstico em Odontologia, entrei no site do jornal The New York Times e li um texto interessante (o vídeo também é bacana) sobre o uso de tomografias cone beam nos consultórios odontológicos nos EUA. O que o texto alega é que há uma proliferação do uso sem os cuidados para com o pacientes, e muitas vezes de forma inadequada ou desnecessária. Link: http://www.nytimes.com/2010/11/23/us/23scan.html?_r=2&hpw

O colega Reynaldo Leite Martins Jr. escreveu, em resposta a colocação deste mesmo texto do jornal em seu site, algo que concordo. Retirei uma das frases (texto completo no fórum do site www.dtmedor.com.br):

“Me preocupo um pouco em relação ao resultado da equação “imagem excelente” + “clínico despreparado para diagnóstico”, que frequentemente pode resultar em equívocos de diagnóstico com consequentes sobretratamento e/ou protelamento de um tratamento correto.”

Atenção: deixo bem claro que não sou contra a tecnologia (até gosto bastante por sinal) mas desde que bem empregada.

 

Bem, não vou me alongar neste assunto. Leiam e tirem suas próprias conclusões! Em especial, leiam a resposta do Prof. Charles Greene (última carta).

Abraços a todos!!

P.S.: para quem quiser saber mais sobre a tomografia cone beam e seu uso, ótimo texto aqui.

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Textos sobre DTM publicados a partir do JOR CORE

Em 2009, em Sienna na Itália, foi realizado um curso de verão, direcionados a doutores e alunos de doutorado, promovido pelo Journal of Oral Rehabilitation com tema relacionado à DTM. Este curso foi o 1st Colloquium on Oral Rehabilitation (JOR-CORE). Neste curso os alunos puderam estar em contato com docentes renomados da área. E então, foi publicado agora em 2010 na revista Journal of Oral Rehabilitation um comentário sobre alguns temas que foram discutidos neste curso sobre DTM. Para quem tem acesso a revista, o link é este: http://www3.interscience.wiley.com/journal/123359578/abstract?CRETRY=1&SRETRY=0

Achei interessante ter acesso a este texto no momento que estamos organizando o primeiro consenso de especialistas sobre DTM no Brasil. Infelizmente, somente quem tem acesso a revista poderá ler estes comentários, mas vou tentar resumir e colocar a essência deste texto para conhecimento geral.

Os comentários realizados neste texto deram origem a quatro grandes revisões sobre os temas: patofisiologia da DTM; ortodontia, oclusão e DTM; tratamento da dor na DTM e; avaliação da DTM e reabilitação do sistema mastigatório que serão ainda publicadas também no mesmo periódico. De modo geral o texto discorre sobre estes assuntos, evidenciando o que há de mais atual sobre cada tópico. Leia mais abaixo.

O que surgiu de novidade neste texto foi a introdução do conceito de incapacidade ou inabilidade.

Limitação e incapacidade são aspectos principais na DTM e podem influenciar outras áreas da Odontologia também. O autores frisam é que é um desafio incorporar a importâncias destes aspectos na prática clínica diária (muitos não fazem sequer uma investigação do problema, não é mesmo?) sobretudo pela visão mecanicista da Odontologia e a falta de estudos na área. Uma sugestão inédita apresentada pelos autores seria a adoção de um modelo de avaliação para atendimento primário na Odontologia, ou seja, para os clínicos gerais ou especialistas que não tenham como principal foco a dor, que incorporasse o sistema de sinais vermelhos e amarelos (red e yellow flags – a tradução é minha mesmo, rs…). Os sinais vermelhos referem-se a condições sérias como dor que acorda o paciente, vícios, intenção de suicídio que podem estar diretamente associadas a morbidade e mortalidade. Sinais amarelos identificariam fatores psicossociais que poderiam influenciar na resposta ao tratamento odontológico. Seriam estes: dor, limitação funcional, desabilidade relacionada a dor, depressão, ansiedade, sintomas físicos não específicos, e qualidade de vida relacionado à saúde oral (existem questionários específicos para isso como o Oral Health Impact Profile-OHIP).

Mas como identificar estes fatos no paciente? Os autores sugerem o uso rotineiro de um instrumento auto aplicável (um questionário) aos pacientes associada a uma entrevista detalhada sobre sua queixa (já falei sobre isso também em outro post).

A proposta é que o questionário tenha não mais de 20 itens e examine aspectos relacionados a ansiedade, depressão, angústia e incapacidade social. Entretanto eles não sugeriram um questionário específico.

Durante a anamnese, o cirurgião dentista deverá observar alguns pontos sobre a queixa principal: cronicidade, limitação funcional, discrepância com os achados clínicos, abuso de medicamentos, comportamento inapropriado, expectativas sobre o tratamento inapropriadas, respostas inadequadas a outros tratamentos já realizados e identificação de sinais vermelhos no questionário.

É claro que os autores chamam a atenção para o fato de que isso ainda não foi testado ou validado, mas é uma perspectiva nova e interessante de avaliação do paciente. Com certeza novas publicações surgirão sobre este questionário e este método.

Achei a proposta diferente e interessante. A figura abaixo, retirada do texto, é um algoritmo sobre a aplicabilidade clínica deste método.

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Declaração da Associação Americana de Pesquisa Odontológica sobre DTM

Recebi por email a notícia de uma declaração sobre DTM cujo teor foi elogiado por profissionais que estudam a dor orofacial por todo o mundo.

Pela iniciativa então do colega José Luis Peixoto Filho, a tradução foi realizada e enviada para ser colocada aqui de forma que todos tenham acesso a ela! Divulguem!!

Abraços a todos

Declaração de revisão política da Associação Americana de Pesquisa Odontológica (AADR) sobre Disfunção Temporomandibular (DTM).

Aprovada no Conselho da instituição em 3/3/2010.

Original:  http://www.aadronline.org/i4a/pages/index.cfm?pageid=3465

A Associação Americana de Pesquisa Odontológica (AADR) reconhece que as Disfunções Temporomandibulares (DTM) englobam um grupo de condições musculoesqueléticas e neuromusculares envolvendo as articulações temporomandibulares (ATM), os músculos mastigatórios, e todos os tecidos associados. Os sinais e sintomas associados com essas disfunções são diversos, e podem incluir dificuldade em mastigar, falar, ou em outras funções orofaciais. Estão frequentemente associadas com dor aguda ou persistente, e o paciente também pode sofrer de outras desordens dolorosas (comorbidades). As formas crônicas das DTM dolorosas podem acarretar afastamento ou incapacidade no trabalho ou em atividades sociais, resultando em diminuição da qualidade de vida de forma geral.

Baseado em evidências derivadas de pesquisas clínicas bem como estudos experimentais e epidemiológicos:

1)      recomenda-se que o diagnóstico diferencial das DTM ou condições dolorosas orofaciais relacionadas deve basear-se primariamente em informações obtidas a partir da entrevista do paciente (anamnese), exame clínico e, quando indicado, exames radiográficos das ATM ou outros procedimentos imageológicos. A escolha de procedimentos diagnósticos adjuvantes deve ser baseada em dados publicados, revisados independentemente (“peer-reviewed”), que demonstrem sua eficácia diagnóstica e segurança. No entanto, o consenso da literatura científica recente sobre dispositivos eletrônicos atualmente disponíveis para o diagnóstico das DTM é que, exceto para várias modalidades imageológicas, nenhum deles demonstra sensibilidade ou especificidade necessárias para se distinguir indivíduos normais de pacientes de DTM ou para distinguir diferentes subgrupos de DTM. Atualmente,procedimentos médicos usuais de diagnóstico ou testes laboratoriais usados para a avaliação de condições similares de natureza ortopédica, reumatológica e neurológica podem também ser usados quando indicados em pacientes de DTM. Adicionalmente, vários testes psicométricos padronizados e validados podem ser usados para a avaliação da dimensão psicossocial de cada paciente de DTM.

2)      recomenda-se enfaticamente que, a menos que existam indicações específicas e justificadas para o contrário, o tratamento inicial das DTM deve ser baseado no uso de modalidades terapêuticas conservadoras, reversíveis e baseadas em evidências. Estudos sobre a história natural de muitas DTM sugerem que elas tendem a melhorar ou se resolver com o passar do tempo. Apesar de nenhuma terapia específica ser uniformemente efetiva, muitas das terapias conservadoras provaram ser no mínimo tão efetivas em proporcionar alívio sintomatológico quanto as formas de tratamento invasivas. Pelo fato dessas modalidades terapêuticas não produzirem modificações irreversíveis, elas apresentam muito menos risco de causar malefício. Ao tratamento oferecido pelo profissional deve-se adicionar um programa de cuidados domiciliaresem que o paciente é ensinado sobre seu problema e como ele pode controlar os sintomas.